
Confeiteiras se reinventam na Páscoa diante da crise do cacau
Entenda como a alta dos insumos tem impactado o setor e exigido criatividade e adaptação para garantir a sustentabilidade dos negócios
Por Amanda Stabile
16|04|2025
Alterado em 16|04|2025
Suhellen Killberth tinha 19 anos quando decidiu adoçar o mundo — um pastelzinho de leite ninho por vez. Com as mãos cheias de sonhos e uma bandeja, saiu pelas ruas de Diadema e pelos bairros de São Paulo, como Jabaquara e Santo Amaro, oferecendo versões recheadas com Nutella e morango.
Porém, o calor intenso acabou atrapalhando os negócios, fazendo com que tivesse perdas significativas. “O sol acabava abrindo os pastéis, comprometendo a qualidade dos produtos e inviabilizando as vendas”, lamenta. Ela então resolveu se reinventar, apostando nos brigadeiros gourmets.
Entre um “não” apressado de quem passava e o sorriso da freguesia fiel, foi se aperfeiçoando. Começou vendendo por unidade e evoluiu para a oferta de caixinhas com quatro. O que era um bico para pagar as contas mais urgentes, foi garantindo um espaço importante no coração de Suhellen. “Foi assim que descobri minha paixão”, conta.
Hoje, aos 24 anos, é fundadora da SuuhSweets. Além de trabalhar diariamente com encomendas de brigadeiros personalizados, geladinhos gourmet, bolos de pote e cookies, divide os conhecimentos com seus alunos de confeitaria. “Trabalho adoçando momentos especiais e ensinando outras pessoas a transformarem a confeitaria em um negócio de verdade, assim como eu fiz”, celebra.
Mas o caminho da confeitaria também tem momentos amargos. De cinco anos pra cá, a Suhellen viu os preços das matérias primas aumentarem significativamente. Só entre 2023 e 2025, o preço do cacau disparou 190% por conta dos impactos das mudanças climáticas nas lavouras dos maiores produtores do fruto no mundo, no continente africano.
No ano passado, paguei R$69,90 em um pacote de 2 kg de chocolate. Este ano, o mesmo produto está custando R$130,00.
Outros itens essenciais para a confeitaria também sofreram aumentos consideráveis nos preços. É o caso do leite e seus derivados. Em outubro de 2024, por exemplo, iogurtes e as bebidas lácteas registraram aumento de 5,89%, enquanto os derivados tiveram crescimento de 11,26%.
Na tentativa de baratear a produção e ofertar produtos na mesma média de preço, as empresas têm apostado na fabricação de similares, também chamados de “segunda linha”, compostos por misturas com soro de leite, amido, gordura vegetal e outros aditivos. “Isso afeta diretamente o resultado final nas receitas”, pontua.
Mas qualidade sempre foi um dos pilares da SuuhSweets e, para alavancar suas vendas na Páscoa, uma data tão especial para quem trabalha com confeitaria, adotou algumas estratégias. Ela aposta nas vendas antecipadas, que permitem ao cliente conhecer o produto com calma — e a ela, organizar a produção sem correria.
Em 2024, decidiu ir além: adotou ações promocionais bem pensadas, que valorizam o produto sem desvalorizar seu trabalho. Buscou fornecedores com preços melhores, fez contas, e criou uma oferta que equilibrasse desejo e dignidade: manteve o padrão de qualidade, ofereceu um preço competitivo, e garantiu rentabilidade.
“O grande destaque das vendas tem sido o ovo temático do Stitch, criação exclusiva minha, que rapidamente se tornou uma verdadeira febre entre os clientes”, explica. O produto une criatividade, apelo visual e muito sabor — características que conquistam adultos e crianças.
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É sobre doces, mas não só sobre isso!
Edileuza Miranda, a Di, também atravessou mais uma Páscoa equilibrando sabor, cuidado e planilhas. Conta que o bolso sofreu com o aumento do creme de avelã, dos granulados de qualidade e até do chocolate em pó. Cada reajuste impacta diretamente o planejamento e, claro, o preço final dos produtos.
Mas quem tem mais de 20 anos de estrada na confeitaria aprende a transformar desafio em receita nova. À frente da Di Miranda Cake Design, em São Gonçalo (RJ), ela ajustou os ingredientes e as estratégias para manter o que chama de seu equilíbrio ideal: oferecer um bom custo-benefício ao cliente, sem comprometer a rentabilidade do negócio.
Di faz questão de dividir esses segredos com quem está começando. Em sua escola de confeitaria, onde ensina presencialmente, ela ensina mais do que técnicas — compartilha visão de negócio e confiança.
Acredito muito que a confeitaria pode transformar vidas.
“Ver meus alunos crescendo com seus próprios negócios é uma das maiores alegrias que eu tenho”, confessa.
Nessa Páscoa, uma de suas apostas foram os ovos tabletes – barras de chocolate no formato de ovos de Páscoa. São mais econômicos do que os ovos tradicionais, mas proporcionam o mesmo brilho nos olhos de quem recebe. Os clientes amaram a inovação e Di se sentiu realizada por oferecer soluções que podem ser replicadas por quem está começando na área.
Outra mudança no cardápio foi a decisão de trabalhar com ovos tradicionais em tamanhos menores e de enxugar a variedade dos ovos de colher. Sempre trabalhou com uma grande variedade de tamanhos e sabores e com encomendas antecipadas, mas como conhece bem o próprio público — que costuma deixar as compras para a última hora — resolveu adaptar.
Com base em um estudo de comportamento do consumidor, decidiu abrir seu ateliê de cursos como loja durante três dias, oferecendo produtos de pronta entrega. A ideia é disponibilizar opções presenteáveis — como ovos tabletes, barras recheadas, doces menores e alguns ovos de colher. “Tudo pensado para facilitar a vida do cliente e garantir boas vendas, mesmo com os desafios dos custos mais altos”, resume.
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Qualidade não é algo negociável!
Poliana Rodrigues tem 26 anos e atravessa sua oitava Páscoa como confeiteira. Mas é a primeira com um ponto físico: uma lojinha de paredes cor-de-rosa inaugurada em fevereiro, no bairro Resplendor, em Igarapé (MG). O nome na fachada carrega duas histórias entrelaçadas — a da filha, Poli Confeitos, e a da mãe, Solange Salgados. Mãos que moldam doces e salgados, lado a lado.
Os ovos tabletes, que hoje se multiplicam pelas redes sociais como tendência em tempos de insumos caros, já adoçam seu cardápio há pelo menos três anos. A ideia surgiu ao assistir uma aula no Instagram da Chocolatier Renata Penido. “Quando eu vi, foi amor à primeira vista”, confessa.
Como a maioria das confeiteiras, fazer alterações nos produtos oferecidos nesta Páscoa foi algo inevitável para Poliana.
O mesmo chocolate que ano passado paguei R$58,90 esse ano atingiu a marca dos R$139,90. Mas por aqui qualidade não é algo negociável
Então, foi preciso adaptar. Os ovos de colher, que costumavam ser oferecidos em vários tamanhos, reduziram-se a um só. Os ovos trufados também estão menores e são vendidos em dupla. Em compensação, as lembrancinhas ganharam espaço, pensadas com carinho para não assustar o bolso de quem compra — nem o coração de quem vende. “Pensa quanto ficaria um ovo de quase 1 kg, por exemplo?”, provoca.
Mesmo com os reajustes, a surpresa: o campeão de vendas até agora foi justamente a dupla tamanho P, por R$175. “Talvez nós, confeiteiras, nos assustamos tanto com o valor do chocolate que imaginamos um cenário mais caótico”, reflete. “Mas com boa divulgação e um trabalho bem feito, superamos qualquer crise”.
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Elizabeth Teixeira, liderança camponesa, completa 100 anos
Nesta quinta-feira (13), a liderança camponesa Elizabeth Teixeira completa 100 anos de vida. A paraibana do município de Sapé se firmou como referência na luta por reforma agrária e pelos direitos dos trabalhadores do campo. Por sua atuação, foi perseguida durante a ditadura militar e teve parte de sua trajetória contada no documentário Cabra Marcado […]